sábado, 12 de junho de 2010

"(...) [O] triste cãozinho reuniu todas suas forças, atravessou o patamar, sem nenhuma dúvida sobre o caminho, como se fosse um visitante habitual, e começou a descer as escadas. (...) Passou por entre as grades do portão, prosseguiu para o lado esquerdo, desapareceu.
Era, no entanto, uma forma de vida. Uma criatura desse mundo de criaturas inumeráveis. Esteve ao meu alcance, talvez tivesse fome e sede: e eu nada fiz por ele; amei-o, apenas, com uma caridade inútil. Deixe-o partir, assim humilhado, e tão digno, no entanto: como alguém que respeitosamente pede desculpas de ter ocupado um lugar que não era seu.
Depois pensei que nós todos somos, um dia, esse cãozinho triste, à sombra de uma porta. E há o dono da casa, e a escada que descemos, e a dignidade final da solidão."

Ilusões do mundo - Cecília Meireles

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