Sentia dentro de mim um estímulo cada vez mais forte, e cheguei a devanear algo que pode ser considerado a pior das coisas de que um homem é capaz. A vítima, como era de esperar, era um colega de turma, um nadador habilidoso, dono de um admirável porte físico.
O local era um porão. Um banquete secreto estava sendo oferecido. Sobre a toalha de mesa de um branco imaculado, resplandeciam candelabros elegantes; facas e garfos de prata enfileiravam-se à direita e à esquerda dos pratos. Havia também os habituais arranjos de cravos. Apenas o espaço demasiado grande deixado no centro da mesa causava estranhamento. Sem dúvida, um prato muito grande seria servido.
— Ainda não?
A pergunta era de um dos comensais. Não pude ver seu rosto por causa da escuridão, mas o timbre de voz era solene, de um homem idoso. Aliás, não podia enxergar o rosto de nenhum dos presentes devido à penumbra. Somente mãos alvas se projetavam sob a luz, manipulando reluzentes facas e garfos de prata. Pairava no ar um murmúrio que ora lembrava uma incessante conversa em voz baixa, ora vozes que falavam sozinhas. Era um banquete fúnebre no qual, além do ocasional ranger das cadeiras, não se distinguiam outros sons. — Acho que logo, logo ficará pronto.
Respondi, obtendo apenas um silêncio lúgubre. Percebi que todos haviam ficado descontentes com minha resposta.
— Gostariam que eu fosse dar uma olhada?
Levantei-me e abri a porta da cozinha. Lá, num canto, havia uma escada de pedra que levava para o piso térreo.
— Ainda não?
Perguntei ao cozinheiro. — O quê? Logo vai ficar pronto.
Também mal-humorado, ele parecia picar algumas folhas e respondeu-me sem levantar a cabeça. Sobre a enorme mesa feita de tábua grossa, do tamanho de dois tatames, não havia nada.
Do alto da escada, desciam risadas. Ergui os olhos e vi outro cozinheiro descendo, segurando o braço de meu colega, um rapaz robusto. O menino usava calças compridas comuns e uma camiseta azul-marinho que deixava seu peito à mostra.
— Ah, é B, não é mesmo?
Chamei seu nome sem pensar. Ao chegar ao pé da escada, com as mãos enfiadas nos bolsos, ele sorriu para mim com malícia. Então, de súbito, o cozinheiro saltou sobre ele por trás e apertou-lhe o pescoço. O menino resistiu com violência.
“Será que é um golpe de judô? É isso, um golpe de judô... Como se chama mesmo? Isso... Aperte o pescoço... Não vai morrer de verdade... Só vai desmaiar...”
Pensava comigo mesmo, enquanto assistia àquela luta miserável. De repente, o pescoço do jovem pendeu sem vida do braço robusto do cozinheiro. Então, sem nenhum esforço, ele o levantou e depositou sobre a mesa. O outro cozinheiro se aproximou e, com mãos de burocrata, tirou a camiseta, o relógio, as calças, deixando-o rápida e totalmente nu. O corpo despido do menino jazia com o rosto virado para cima e a boca entreaberta. Dei um longo beijo naqueles lábios.
— É melhor de barriga para cima ou de bruços? — perguntou-me o cozinheiro.
— Acho que de barriga para cima.
Assim respondi porque, daquela maneira, o peito, que parecia um escudo da cor de âmbar, ficaria à mostra. O outro cozinheiro puxou da prateleira uma enorme travessa ao estilo ocidental, do tamanho exato para comportar um ser humano. Era estranha, com dez pequenos furos, cinco em cada borda.
— Um, dois, três!
Os dois cozinheiros deitaram o rapaz inconsciente na travessa, de barriga para cima. Assobiando alegremente, passaram uma corda fina pelos buraquinhos das duas bordas e amarraram o corpo com firmeza. Suas mãos ágeis mostravam habilidade. Enfileiraram grandes e vistosas folhas de salada à volta do corpo nu. Por fim, uma faca e um garfo de aço, excepcionalmente grandes.
— Um, dois, três!
Os dois ergueram a travessa sobre os ombros. Eu abri a porta da sala de jantar.
Fui recebido por um silêncio de boas-vindas. O prato ocupou o espaço que lhe fora reservado na mesa, que cintilava pálida à pouca luz. Voltei ao meu lugar e, de um dos cantos da travessa, ergui com as mãos a faca e o garfo enormes.
— Por onde devemos começar?
Não houve resposta; sentia-se no ar muitos rostos se projetando à volta do prato.
— Aqui deve ser um bom lugar.
Cravei o garfo no coração. Um jato de sangue atingiu-me em cheio o rosto. Empunhando a faca com a mão direita, comecei a cortar sem pressa a carne do peito, primeiro em fatias finas...
Yukio Mishima - Confissões de uma máscara